o bairro de Salvador que equilibra concreto e respiros verdes


Ciclistas circulam no Jardim dos Namorados –

Em meio à efervescência de Salvador, a Pituba se ergue como um bairro pulsante e densamente construído, mas atravessado por espaços de respiro que revelam outra dimensão da vida urbana. Suas avenidas largas, o trânsito incessante e o comércio que não descansa moldam uma paisagem de movimento constante.

Contudo, entre os prédios altos e o asfalto quente, brotam recantos de sombra, de verde e de mar aberto, capazes de oferecer aos moradores e visitantes uma pausa para o corpo e para a mente. É essa combinação de concreto e natureza, de agitação e contemplação, que define a essência multifuncional da Pituba — território que aprendeu a equilibrar a vida moderna com a necessidade vital de encontro e contemplação.

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A história do bairro ajuda a compreender esse mosaico. Antes de ser sinônimo de verticalização, shopping centers e comércio vibrante, a Pituba foi uma região de dunas, coqueirais e sítios de veraneio.

Durante muito tempo, a “Pituba dos coqueiros” foi espaço de fazendas e pequenas casas de descanso, onde a cidade ainda não havia estendido sua pressa. Foi apenas a partir da década de 1960, com os planos urbanísticos de expansão para além da Graça e da Barra, que o bairro começou a se configurar como vetor de crescimento moderno.

A construção da Avenida Manoel Dias da Silva e, posteriormente, da Avenida Paulo VI, deu corpo a essa transformação. O que antes era paisagem de areia e mar começou a se tornar o território multifacetado que hoje abriga residências, escritórios, comércio, praças e parques.

O coração comunitário

Praça Ana Lúcia Magalhães

As praças da Pituba condensam muito desse espírito comunitário. A Praça Ana Lúcia Magalhães , localizada entre a Paulo VI e a Manoel Dias, é considerada uma das mais vibrantes do bairro. Seu espaço amplo, com parquinho, pista de caminhada, árvores bem cuidadas e bancos confortáveis, acolhe desde famílias com crianças até trabalhadores que fazem dali uma parada estratégica para o almoço.

Frequentemente, recebe feiras gastronômicas e de artesanato, transformando-se em palco da diversidade cultural soteropolitana.

À noite, a iluminação convida grupos de jovens e idosos a permanecerem, dando vida a um espaço que poderia ser apenas passagem, mas que se tornou ponto de encontro e de identidade local.

Praça Ana Lúcia Magalhães

Praça Ana Lúcia Magalhães | Foto: Uendel Galter / Ag. A Tarde

Praça Nossa Senhora da Luz

Já a Praça Nossa Senhora da Luz , situada em frente à igreja homônima, traduz outro ritmo. Menor e mais intimista, guarda um ambiente acolhedor, quase de interior, mesmo no coração da capital.

É comum ver idosos aproveitando a sombra das árvores, mães acompanhando filhos no parquinho ou simplesmente pessoas que buscam alguns minutos de silêncio entre compromissos. É uma praça que se oferece como respiro, e por isso permanece tão valorizada pelos moradores.

Lagoa dos Patos

Mais adiante, a Lagoa dos Patos se impõe como uma paisagem singular. A superfície espelhada da água, cercada por vegetação, é refúgio para aves migratórias e também para os moradores que buscam contemplação.

Antigamente, era espaço de brincadeiras de crianças e até mesmo de pescarias improvisadas. Hoje, permanece como um símbolo de resistência da natureza em meio ao concreto.

Lagoa dos Patos

Lagoa dos Patos | Foto: Clara Pessoa / Ag. A TARDE

Jardim dos Namorados

Não muito longe, o Jardim dos Namorados se estende sobre a orla como uma varanda para o Atlântico. Revitalizado nos anos 2000, é hoje um dos principais pontos de lazer e esportes do bairro.

Mas mantém, sobretudo ao entardecer, um caráter contemplativo: o pôr do sol visto dali é considerado um dos mais belos da cidade, quando o céu se decompõe em laranja, violeta e azul profundo.

Pulmão urbano: o Parque da Cidade

Se as praças e a orla oferecem respiros, o Parque da Cidade Joventino Silva representa o grande pulmão verde de Salvador. Localizado entre a Pituba e o Itaigara, com quase 700 mil metros quadrados, ele preserva fragmentos importantes da Mata Atlântica e abriga espécies nativas que resistem à pressão urbana. Suas trilhas sinuosas atraem corredores, ciclistas e famílias, mas também aqueles que buscam práticas mais silenciosas, como meditação e yoga.

O parque vai além da função recreativa: é espaço de sociabilidade e de cultura. Suas quadras e pista de skate recebem crianças e adolescentes, enquanto o anfiteatro ao ar livre já foi palco de grandes eventos, festivais musicais e manifestações comunitárias que marcaram época.

Entrada principal do parque

Entrada principal do parque | Foto: Olga Leiria / Ag. A TARDE

Para muitos moradores, frequentar o Parque da Cidade é uma forma de manter vínculos com a memória coletiva e, ao mesmo tempo, projetar uma cidade mais sustentável. Ele demonstra que a vida urbana não precisa estar em conflito com a natureza, mas pode se articular a ela.

A orla requalificada: esporte, lazer e memória

A transformação mais visível da Pituba nos últimos anos aconteceu na orla atlântica , requalificada e devolvida à população como espaço democrático. O calçadão, os quiosques, a ciclovia e os equipamentos de ginástica redesenharam a relação do bairro com o mar. Hoje, é comum ver desde ciclistas em treinos intensos até grupos de idosos caminhando lentamente, todos compartilhando o mesmo espaço.

Orla da Pituba

Orla da Pituba | Foto: Leo Coutinho / Ag. A TARDE

O destaque maior é a Arena Aquática Salvador , inaugurada no final de 2018 no terreno do histórico Clube Português. Se antes o espaço era palco de bailes de debutantes, festas de formatura e shows de artistas em ascensão — como a banda Scorpius, embrião do Chiclete com Banana —, hoje ele se reinventa como centro de inclusão esportiva.

Com piscinas olímpicas e estrutura moderna, a Arena oferece aulas gratuitas de natação e hidroginástica, abrindo possibilidades que antes eram privilégio de poucos. É memória transformada em futuro, tradição convertida em acesso democrático.

Arena Aquatica Salvador

Arena Aquatica Salvador | Foto: Leo Coutinho / Ag. A TARDE

A revitalização da orla também fortaleceu práticas tradicionais, como a pescaria de xaréu na altura da Praça Nossa Senhora da Luz, onde dezenas de homens se reúnem em torno da disputa entre peixe e pescador, numa cena que mistura ritual, esporte e espetáculo comunitário. Ali, o bairro se revela em sua dimensão mais humana: o lazer popular como espaço de cura, convivência e partilha.

Pituba: mosaico vivo de cidade

O que torna a Pituba singular é essa capacidade de combinar múltiplas dimensões em um mesmo território. Suas ruas e praças guardam memórias de antigas fazendas, festas do Clube Português, pescarias à beira-mar e feiras comunitárias. Mas também se projetam em direção ao futuro, com ciclovias, centros de esporte e parques que se reinventam.

A cada passo dado por suas calçadas, é possível perceber essa convivência de tempos: o riso de crianças que hoje brincam na Praça Ana Lúcia Magalhães ecoa os passos dos jovens que, décadas atrás, faziam babas no Jardim dos Namorados. As pedaladas na ciclovia se misturam ao cheiro de acarajé nos quiosques. O silêncio da Lagoa dos Patos resiste como memória natural em meio à pressa dos automóveis.

Arivaldo Ferreira Filho, ciclista na orla da Pituba

Arivaldo Ferreira Filho, ciclista na orla da Pituba | Foto: Leo Coutinho / Ag. A TARDE

Na Pituba, viver a cidade é também recuperar a memória e reinventá-la. É um bairro onde o urbano e o natural se encontram, onde o progresso não apagou totalmente os respiros verdes, e onde cada praça, parque ou trecho da orla oferece não apenas lazer, mas também pertencimento.

“É uma coisa muito gostosa, uma terapia”, já disse um dos frequentadores assíduos da orla, resumindo em poucas palavras aquilo que muitos sentem sem conseguir traduzir: a Pituba é mais que bairro, é lugar de cura, de convívio e de reinvenção diária da vida urbana.

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