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Famílias brasileiras usam quase 10% do orçamento para pagamento de juros



Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil/Arquivo
Comprometimento do orçamento com débitos no país é quase o triplo da média de nações desenvolvidas 24 de agosto de 2025 | 11:21

Famílias brasileiras usam quase 10% do orçamento para pagamento de juros

As famílias brasileiras comprometem quase 10% da renda apenas com o pagamento de juros, em um sintoma da baixa qualidade do endividamento do brasileiro, composto em sua maior parte por obrigações de curto prazo e taxas elevadas.

Em maio último, mostram dados do Banco Central, esse peso alcançou 9,86%, o maior da série histórica iniciada em 2005 e pouco acima do patamar atingido em 2023, quando houve o lançamento do programa Desenrola, criado para estimular a renegociação de débitos.

Atualmente, o equivalente a 27,79% da renda das famílias é direcionado ao pagamento de amortização de dívidas mais os juros —ou seja, as taxas representam mais de um terço do total.

Esse percentual é quase o triplo da média de 17 países desenvolvidos, cujos dados de dívidas das famílias em relação à renda são disponibilizados pelo BIS (Banco de Compensações Internacionais). Nos Estados Unidos, por exemplo, as famílias destinam o equivalente a 8% do orçamento ao pagamento de dívidas, e no Japão, o peso é de 7,8%.

“No mundo todo existe comprometimento de renda com dívidas. A diferença é que no Brasil a maior parte é com débitos relacionados a cartão de crédito ou empréstimo pessoal, que possuem taxas maiores”, afirma Rafael Schiozer, professor titular de finanças da FGV-EAESP.

Números do BC ajudam a explicar essa diferença. O comprometimento da renda das famílias brasileiras especificamente com o crédito imobiliário, que possui os menores juros entre as diferentes modalidades de empréstimos e é acessível a poucos brasileiros, é de apenas 2,13%.

Ou seja, o restante, ou 25,66% do comprometimento da renda das famílias brasileiras, roda a juros mais altos.

Estêvão Kopschitz, economista do Grupo de Conjuntura do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), aponta que grande parte das dívidas brasileiras é formada por operações de crédito de curto prazo, que são exatamente as que possuem taxas maiores.

“Em países desenvolvidos, o endividamento das famílias é bastante voltado para pagar crédito habitacional, que tem a garantia do próprio imóvel e que não possui um peso tão grande na despesa mensal porque os juros são baixos”, afirma.

SINAL AMARELO

Os dados do BC mostram que o peso do pagamento de juros sobre o orçamento familiar teve um pico em 2023 e caiu em 2024, mas voltou a crescer do final do ano passado para cá. Essa piora no cenário tem a ver com dois fatores: uma combinação perigosa de juros mais altos e mais crédito.

Em junho, último dado disponibilizado pelo BC, a taxa média anual do crédito pessoal estava em 58,3%, o maior nível desde maio de 2023. Ao mesmo tempo, nos últimos dois anos o saldo de crédito com recursos livres (que exclui os empréstimos imobiliários) saltou 23,4%.

Fábio Pina, assessor econômico da FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo), aponta que o crédito cresceu impulsionado pelo emprego e renda mais robustos dos últimos anos.

“O que explica o crescimento do peso dos juros é o fato de que tenho emprego e renda aumentando, o que na percepção do setor financeiro reduz um pouco o risco e eleva o crédito. Isso aconteceu apesar de as taxas de juros terem aumentado”, diz.

Na avaliação dele, o Brasil vive um momento de “sinal amarelo” em relação ao endividamento. Após recuar de um pico alcançado em 2023, o calote de mais de 90 dias das pessoas físicas voltou a se elevar para 6,3%, segundo o último dado do Banco Central.

O assessor econômico da FecomercioSP é autor de um estudo que mostra que os gastos com juros dos lares brasileiros cresceram 20,5% em 2024 na comparação com o período anterior. Mas, no mesmo período, a massa de renda anual das famílias avançou apenas 3,2%.

O aumento na educação financeira é apontado pelos especialistas como necessária para ajudar a reduzir o endividamento ruim, mas não é considerada uma bala de prata.

“O Brasil precisa de mais educação financeira. Já melhorou muito, existe uma iniciativa do Banco Central, por exemplo, de educação financeira nas escolas. Mas é necessário também um comportamento individual das pessoas, de se conscientizarem de que tomar crédito de curto prazo é mais caro”, afirma Kopschitz, do Ipea.

Para Schiozer, é necessário um consumo mais cuidadoso. “Evitar o superendividamento é, em essência, ter um consumo compatível com a renda. Sou um pouco cético em relação à educação financeira como bala de prata, acho que muitas pessoas têm consciência de que estão gastando mais do que ganham. Então na verdade o que é mais necessário é uma mudança de hábitos.”

Ele cita um estudo do Banco Central que mostra que o incentivo ao crédito consignado (com desconto em folha de pagamentos) pode ter um impacto negativo no consumo de longo prazo. “Depois de dois, três anos, as pessoas tiveram uma redução de consumo muito maior do que a alta logo que tomaram crédito. É um exemplo da consequência de longo prazo do superendividamento”.

Maeli Prado/Folhapress



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Cenário de mundo dividido por Trump gera atraso na transição energética, afirma CEO da Shell



Foto: Divulgação/Shell
Cristiano Pinto da Costa, CEO da Shell Brasil 24 de agosto de 2025 | 11:41

Cenário de mundo dividido por Trump gera atraso na transição energética, afirma CEO da Shell

O tradicional estudo anual dos cenários que a Shell elabora desde a década de 1970 para embasar suas decisões estratégicas vai ser divulgado nesta segunda (25) com novas perspectivas sobre o futuro da energia no mundo. Segundo Cristiano Pinto da Costa, CEO da Shell Brasil, foi introduzido um outro cenário, contemplando os efeitos da inteligência artificial, que elevará a demanda energética.

Enquanto o presidente americano Donald Trump avança com sua política tarifária, o cenário que se destaca é aquele que a empresa chama de Arquipélagos e retrata um mundo nacionalista, com pouca cooperação global.

“No cenário Arquipélagos, em que o mundo fica um pouco mais fragmentado, confrontacional e não colaborativo em relação a políticas de transição energética, cada país passa a olhar para o seu interesse próprio versus o interesse coletivo da humanidade em migrar para uma economia de baixo carbono. Esses elementos estão exatamente acontecendo agora e se materializando no que estamos vendo na política tarifária do governo americano”, diz.

Costa afirma que, desde 2024, a Shell vem preparando um estudo dos cenários com um recorte específico para o Brasil. Segundo ele, o material será a colaboração da Shell para o debate da COP30.

Pela frente, o executivo vê a demanda por óleo e gás estabelecida por décadas, independentemente do cenário, e reitera a decisão da empresa de frear projetos de energia solar devido à saturação do mercado.

Sobre o interesse da Shell, que no último leilão não fez ofertas na bacia Foz do Amazonas, na chamada margem equatorial, ele afirma que a ideia é focar na Bacia de Santos, onde já atua.

O que os cenários da Shell devem mostrar de diferente neste ano?

Há décadas, a Shell faz cenários globais de segurança e transição energética. Não é previsão de futuro. Tentamos vislumbrar caminhos que o mundo pode tomar e testamos as estratégias de negócio em cada um desses cenários, sabendo que trabalhamos em uma indústria que tem horizonte de muito longo prazo. Em 2024, pela primeira vez, nós trouxemos um recorte específico para o Brasil. Neste ano, a Shell atualizou os cenários globais, introduzindo um terceiro.

Um dos cenários, chamado Horizontes, desenha uma curva em que o mundo atinge emissões líquidas zero em 2050 e o que precisa acontecer para que esse objetivo se materialize.

O segundo cenário é chamado Arquipélagos. Nele, o mundo fica mais fragmentado, com brigas políticas entre países, que ficam mais protecionistas. Cada um olha mais para o seu interesse próprio, seu umbigo. Como consequência, o mundo demora mais para chegar nas emissões líquidas zero.

E o terceiro cenário, que foi introduzido neste ano, é chamado Surge. Ele traz um fenômeno recente, que é a digitalização e a inteligência artificial, que está trazendo um crescimento de demanda por energia. Os data centers estão demandando muito mais energia.

Estes cenários contemplam o clamor global por redução dos combustíveis fósseis?

Todos mapeiam os caminhos possíveis para evolução, crescimento ou declínio das diferentes fontes de energia.

No cenário Horizontes, esse declínio do consumo de energia fóssil é um pouco mais rápido. Nos cenários Surge e Arquipélagos, esse declínio é mais gradual. E o que é comum nos principais pontos de todos os cenários? Primeiro: o mundo continua demandando cada vez mais energia. Segundo: todos os cenários também demonstram um aumento da participação da eletrificação como forma de energia, em velocidades diferentes.

O terceiro ponto é que a demanda por óleo e gás continua existente por décadas, independentemente do cenário, porque o mundo tem hoje uma infraestrutura e um baixo custo desse tipo de energia, que é difícil de replicar ou substituir em uma velocidade mais rápida do que todo mundo gostaria. Então, óleo e gás continuam sendo necessários por décadas. E o gás primordialmente como um combustível de transição.

O quarto ponto são as novas tecnologias. Soluções baseadas na natureza para sequestrar carbono são necessárias, complementares a energias renováveis para que o mundo acelere a transição e chegue em emissões líquidas zero.

E o último fator: um reconhecimento de que geopolítica e transformações tecnológicas podem ser grandes game changers [virada do jogo], acelerando ou desacelerando alguma das rotas.

E o ingrediente Trump e as políticas tarifárias? Como interfere no cálculo dos cenários?

Não interfere no cálculo. Os cenários foram feitos antes do fenômeno das tarifas globais.

No cenário Arquipélagos, em que o mundo fica um pouco mais fragmentado, confrontacional e não colaborativo em relação a políticas de transição energética, cada país passa a olhar para o seu interesse próprio versus o interesse coletivo da humanidade em migrar para uma economia de baixo carbono. Esses elementos, que foram identificados pela Shell no cenário Arquipélagos, estão exatamente acontecendo agora e se materializando no que estamos vendo na política tarifária do governo americano.

Eles fazem, como consequência, que a jornada de transição energética leve mais tempo para se materializar. Então, o que aconteceu com o tarifaço do governo americano atual foi identificado pela Shell como um potencial cenário dentro do Arquipélagos.

Em abril, teve uma mudança na Shell que deu mais relevância para a unidade brasileira. A ação de Trump atrapalha isso de alguma forma?

A Shell está no Brasil há 112 anos, com crescimento exponencial da operação do país nos últimos 7 a 10 anos. Com isso, o Brasil foi elevado à posição de vice-presidência executiva global, reportando direto ao comitê executivo. O nível hierárquico subiu, e eu sento hoje numa mesa global podendo representar o país e fazer uma das coisas mais importantes para mim, que é brigar por mais investimentos no Brasil.

O país é o maior produtor de óleo do grupo. É o maior produtor de etanol, via a joint venture com a Cosan na Raízen. Temos uma grande comercializadora de energia, e estamos tomando algumas posições no mercado de soluções baseadas na natureza, tentando desenvolver um negócio de crédito carbono no Brasil. Temos várias linhas de negócios.

Mas sobre o impacto, que é a tua pergunta: a princípio, são poucos, porque o petróleo foi um dos itens que ficou fora, na lista de isenções. Parte do petróleo brasileiro é exportado para os EUA, mas a maioria vai para a Ásia, China em particular, e um pouco para a Europa. O que estamos observando e ainda tentando entender é: com a mudança de tarifa em vários países, qual é a consequência na cadeia de suprimento dos fornecedores de materiais, equipamentos para os projetos no Brasil? Qual impacto isso pode vir a ter, tanto do ponto de vista de custo para os meus projetos, como prazo de entrega? Esse estudo está acontecendo. Mas a nossa análise inicial é de um impacto pouco material para as operações da Shell no Brasil.

A empresa vai ter alguma iniciativa na COP30? Como pretende contribuir para o debate?

Uma das razões pelas quais decidimos fazer pela primeira vez o recorte de Brasil nos cenários globais foi justamente para que a Shell pudesse dar ao governo e à sociedade brasileira um estudo robusto como nossa contribuição dos potenciais caminhos que o Brasil pode tomar.

Esse recorte aponta potenciais políticas públicas que o Brasil pode vir a adotar para ser um grande ator na transição energética, contribuindo, consequentemente, para o debate da COP30. Nesta segunda (25), vamos apresentar a atualização dos cenários da Shell. Estamos fazendo um estudo que aponta que o Brasil larga na frente ante a maioria das grandes economias com boa parte do dever de casa da transição energética já feito. O Brasil tem a matriz energética mais limpa do mundo. Tem potencial na área eólica e solar. Temos o etanol, o biocombustível, que é o grande combustível da transição. O nosso estudo indica o potencial de triplicar a demanda de biocombustível em 2050 quando comparado a 2020.

Tem tudo para ser um grande ator no mercado de carbono. O estudo mostra que o Brasil tem vários exemplos construtivos que podemos apresentar para o mundo na COP30 do que já foi feito aqui, que pode ser replicado.

Podemos exportar políticas públicas, com o que foi feito no biocombustível. Temos potencial para atuar como grande fornecedor de energia. Óleo e gás têm competitividade. O petróleo brasileiro produzido na bacia de Santos tem uma intensidade de carbono com CO2 emitido por barril bem abaixo da média global. Ao consumir mais petróleo brasileiro, o mundo reduz as emissões globais. O Brasil pode ser um ator em exploração e produção de óleo e gás. Já mostrou que é um grande ator em renovável. Tem o bioetanol como indústria estabelecida que pode ser exportada ainda mais e tem a oportunidade de gerar crédito de carbono. Essa é a contribuição da Shell com esse estudo nos debates para a COP30.

Há um movimento no setor de recuo dos projetos de solar e eólica. Como está esse tema na Shell?

A Shell investiu US$ 45 bilhões em soluções de baixo carbono na última década. Entre 2023 e 2025, estamos investindo entre US$ 10 bilhões e US$ 15 bilhões em soluções de energia de baixo carbono.

Recentemente, foi feita uma atualização estratégica. Em vez de abrir novas frentes e continuar investindo em novos projetos, desaceleramos um pouco os novos projetos globalmente, não só no Brasil.

Aqui no Brasil, decidimos manter o etanol como principal veículo de transição energética e de economia de baixo carbono e paramos os projetos de desenvolvimento de solar, porque o mercado brasileiro estava saturado com muito projeto, o preço da energia, muito baixo. Preferimos não investir nesse momento.

E o debate de licenciamento ambiental no Brasil? Como estão acompanhando?

De perto, como todos na indústria. O Brasil tem uma das leis de licenciamento ambiental mais robustas da indústria globalmente, o que bom. Temos acompanhado com atenção o projeto de lei, os vetos recentes do presidente. Esse debate é saudável para conseguirmos, como sociedade, achar oportunidades de otimizar ou acelerar o processo de licenciamento sem comprometer o rigor necessário para não ter violação de questões ambientais em grandes projetos.

No leilão recente, vocês não entraram na Foz do Amazonas. Levaram Bacia de Santos? Por quê?

Depois da Petrobras, nós somos o segundo maior produtor de óleo e gás. Temos ativo em produção e agora em construção no investimento de Gato do Mato [projeto em águas profundas na área do pré-sal da Bacia de Santos]. Temos a área de exploração, onde nos últimos três anos adquirimos mais de 40 blocos em parceria, em várias geografias do Brasil.

A Shell acredita no futuro geológico, no potencial para continuar crescendo o negócio de exploração e produção no Brasil. Qual foi a estratégia da companhia nesse leilão recente? Há dois anos, compramos outros blocos na bacia Sul de Santos. Estudamos essa bacia e identificamos o potencial. Nesse leilão, nossa decisão estratégica foi concentrar os esforços e recursos, pessoas e dinheiro, para comprar quatro blocos adicionais nessa área em que já tínhamos vantagem competitiva e focamos de forma bem-sucedida, porque ganhamos os quatro blocos que queríamos no leilão nessa área, deixando a margem equatorial para eventuais futuros leilões.

Foi por causa da polêmica?

Não. Foi uma decisão estratégica de concentrar numa área onde já tínhamos a competitividade, onde vemos prospectividade e queríamos consolidar. Eu não tenho recurso para bidar [fazer oferta] em todos os blocos.

Joana Cunha/Folhapress



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Briga por níquel do Brasil expõe disputa global por minério vital para a transição energética



Foto: Divulgação
Complexo da mineradora Anglo American em Barro Alto (GO), para beneficiamento e refino de níquel 24 de agosto de 2025 | 14:00

Briga por níquel do Brasil expõe disputa global por minério vital para a transição energética

Na pequena Barro Alto, localizada na região norte de Goiás, o único semáforo instalado no centro da cidade parece não ter serventia. Com seus 12 mil habitantes, o município goiano segue um ritmo pacato, debaixo de um sol de 40 graus. Em nada aparenta ser o palco de uma disputa bilionária global por jazidas de níquel, um mineral crítico e estratégico para a indústria.

Barro Alto e suas montanhas do minério expõem, com fatos, os movimentos geopolíticos que têm mexido com o destino de nações como os Estados Unidos, a China, países da Europa e o Brasil.

A Anglo American, multinacional de origem sul-africana e britânica que opera na cidade desde 2004, decidiu vender no início deste ano sua planta de níquel para a MMG, um braço da estatal chinesa China Minmetals Corporation. Além da unidade de Barro Alto, entraram na negociação outra planta em Niquelândia (GO) e dois projetos novos de exploração, no Pará e no Mato Grosso.

O negócio avaliado em US$ 500 milhões, o equivalente a mais de R$ 2,7 bilhões, marca a entrada da chinesa MMG no mercado brasileiro de níquel, ampliando o alcance de Pequim sobre um insumo considerado vital para a transição energética. As reações, porém, foram imediatas.

Na Europa, a transação pode virar processo em apuração pela Comissão Europeia. No Brasil, conforme informações obtidas pela reportagem, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) acaba de ser acionado. Por trás de acusações de concentração de mercado e de supostas negociações duvidosas está uma concorrente holandesa, a Corex Holding.

Controlada pelo bilionário turco Robert Yüksel Yıldırım, a empresa via nas minas brasileiras o passaporte para encarar a disputa global com os chineses no mercado do níquel. Dona de plantas de ferroníquel no Kosovo e na Macedônia do Norte, a empresa depende do mercado europeu para escoar sua produção. O negócio brasileiro a traria para as Américas.

Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, Yıldırım disse que não desistiu da aquisição e afirma estar contrariado porque fez uma oferta que representava quase o dobro do valor pago pelos chineses. No entanto, não foi declarado vencedor.

“Vou ser muito honesto, meu preço foi de US$ 900 milhões [R$ 4,9 bilhões]. Coloque-se no meu lugar. Quando você dá um preço muito superior, quase o dobro do outro concorrente, espera pelo menos uma ligação explicando: ‘Yıldırım, por essas razões decidimos não vender para você, escolhemos o outro ofertante, o chinês’. Isso não ocorreu e não sei o motivo. Eles terão de explicar”, disse o empresário.

Na petição entregue em Bruxelas e no Brasil, a Corex afirma que a compra das unidades brasileiras pela MMG aumenta ainda mais a concentração de mercado sob controle chinês, fazendo com que ao menos 60% da oferta global de níquel fique nas mãos de empresas ligadas a Pequim.

“Essa operação ameaça a concorrência e também coloca em risco a segurança de suprimento da União Europeia”, argumentou a companhia, em sua petição.

O caso insere o Brasil em uma disputa maior. A China domina hoje o refino de minerais críticos como níquel, cobalto e terras raras, mas ainda depende de minas no exterior para alimentar suas fundições. Por isso, corre para adquirir ativos estratégicos em diferentes continentes.

A Comissão Europeia ainda não decidiu se vai abrir uma investigação aprofundada sobre a aquisição das operações brasileiras Anglo American pela MMG.

A ofensiva chinesa sobre minas e refinarias de níquel em todo o mundo, especialmente na Indonésia, tem derrubado os preços internacionais, dada a dimensão do controle asiático sobre produção e preços do insumo, que é usado na produção de aço inoxidável e baterias. Por esse motivo, a disputa no Brasil assume aspectos decisivos sobre os rumos do setor, um movimento acompanhado com lupa pela gestão de Donald Trump, nos EUA.

Na carta que enviou ao Cade, a Corex argumenta sobre a concentração de mercado. “No Brasil, as operações de Barro Alto e Codemin (Niquelândia) responderam por 62% da produção nacional de níquel em 2024. A concentração decorrente da operação é, portanto, alarmante”, afirma a empresa. Os dados da Anglo American apontam que essa fatia seria de 52%.

O Cade não comenta processos em andamento.

À reportagem, a Anglo American declarou que a venda de seu negócio de níquel “faz parte da simplificação do portfólio global da companhia, que visa focar na produção de cobre, minério de ferro de alto teor e nutrientes agrícolas”.

Sobre a escolha da oferta chinesa, a empresa declarou que “todo o processo de seleção dos interessados pelo negócio foi feito de forma rigorosa, buscando um comprador responsável” para assumir a operação. “A companhia acredita que o acordo com a MMG representa uma grande realização para os empregados, comunidades locais, acionistas e demais partes interessadas”.

Jorge de Carvalho, diretor de integração da MMG para a nova “Nickel Brazil”, empresa que vai tocar as operações dentro do grupo, disse que não há dinheiro estatal chinês na transação e que a MMG, que é estatal, está financiando a aquisição no Brasil com sua própria liquidez.

“Claro que a China Minmetals Corporation continua sendo nosso principal acionista e tem dado forte apoio a essa aquisição e à estratégia de crescimento da MMG”, declarou.

Questionado sobre como a MMG pretende lidar com questões regulatórias no Brasil, Carvalho disse que a companhia vai atender a todos os requisitos. “Nossa equipe trabalhará em estreita colaboração com os reguladores locais para compreender e responder de forma transparente a quaisquer questionamentos”.

A MMG preferiu não detalhar por que foi a vencedora da oferta. “A equipe da Anglo American é a melhor para falar sobre sua decisão e sobre quem estava competindo com a MMG pelo ativo. Na nossa visão, fazer negócio com a Anglo American foi especialmente importante, já que compartilhamos valores semelhantes”.

Arena da disputa, a pequena Barro Alto vive uma fase de expectativa. “A Anglo ajudou bastante o município a crescer, mas de uns anos para cá a cidade parou no tempo”, diz Iran Fernandes, vice-presidente da Aciaba (Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Barro Alto). “A mineração foi boa, porque tirou Barro Alto da pré-história, mas não colocou no futuro. Ficamos no meio do caminho. A MMG pode dar um F5 nisso. A gente espera que as coisas mudem”.

André Borges/Folhapress



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INSS registra crédito consignado ativo para beneficiários que têm mais de 120 anos



Foto: Pedro França/Agência Senado/Arquivo
Previdência Social 24 de agosto de 2025 | 16:45

INSS registra crédito consignado ativo para beneficiários que têm mais de 120 anos

O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) registra a existência de 86 contratos de crédito consignado ativos para beneficiários com mais de 120 anos, segundo dados obtidos pelo jornal Folha de S.Paulo por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação).

Embora a quantidade não seja significativa perante a soma total de contratos ativos (57,3 milhões), os dados chamam a atenção porque a existência de pessoas vivas nessa faixa etária é incomum.

A reportagem solicitou ao INSS, em 13 de agosto, o número de beneficiários com mais de 120 anos, já que não há informações públicas com esse recorte. O órgão pediu tempo extra para responder, afirmando que dependia de uma extração de dados a ser feita pela Dataprev (empresa pública de tecnologia que presta serviços à Previdência). O prazo foi concedido, mas o INSS não respondeu.

Procurada, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) disse, em nota, que não só desconhece casos de consignado para aposentados com 120 anos ou mais, mas também repudia a oferta de qualquer produto bancário que desconsidere a adoção de políticas preventivas voltadas à proteção de clientes mais vulneráveis, como idosos de idade avançada.

“Ademais, não parece minimamente imaginável que uma pessoa de 120 anos tenha tomado um empréstimo bancário, a não ser que o registro dessa informação decorra de erro material nos dados cadastrais do cliente ou seja fruto de golpe ou fraude. E, hoje, no Brasil, não há registro sobre pessoas vivas com 120 anos ou mais”, afirmou a entidade.

A Febraban disse ainda que as instituições financeiras são bem mais conservadoras na concessão de crédito para clientes com idades mais elevadas. Algumas oferecem prazos menores para pagamento ou preferem nem operar com este público.

A ABBC (Associação Brasileira de Bancos) afirmou, em nota, que “as políticas de concessão de crédito são definidas individualmente por cada instituição financeira, de acordo com seus próprios critérios”. A entidade disse ainda que “desconhece a existência de práticas discriminatórias”.

Os empréstimos consignados para aposentados e pensionistas do INSS entraram na mira de autoridades na esteira das investigações sobre o esquema de fraude nos descontos de mensalidades associativas, alvo da operação Sem Desconto.

As mensalidades e o crédito consignado são produtos diferentes, mas há a suspeita de que ambos foram usados para cometer irregularidades.

No início de 2024, a CGU (Controladoria-Geral da União) apontou, em relatório de auditoria, fragilidades relacionadas à fidedignidade das informações registradas nos consignados, possíveis averbações de empréstimos em benefícios inelegíveis e contratos celebrados com taxas de juros acima do teto fixado pelo governo.

No entanto, o trabalho não foi conclusivo devido a possíveis falhas de validação do sistema de consignados e envio de informações de forma incompleta ou inconsistente. A CGU recomendou uma mudança nas regras da modalidade.

Dados do INSS mostram um crescimento na averbação de créditos consignados —momento em que o contrato é registrado, e a instituição financeira é autorizada a descontar as parcelas de pagamento. Em janeiro de 2025, foram averbados 3,1 milhões de contratos, alta de 55,5% em relação a igual mês de 2024 (2 milhões de contratos).

A advogada Joseane Zanardi, coordenadora regional do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), afirmou que a existência dos 86 contratos de consignado para pessoas com mais de 120 anos chama a atenção.

“Eu acho bastante curioso. Esses beneficiários estão vivos, ou são benefícios fraudados? É uma informação que me causa estranheza, não é um número tão pequeno”, disse.

“Pode ter mais de um contrato por pessoa, dentro do limite consignável. Mas talvez seja um ponto que precise ser analisado com mais atenção, para verificar se não tem nenhum tipo de irregularidade na manutenção desses benefícios e também na concessão desses consignados”, avaliou Zanardi.

Os dados fornecidos por meio da LAI reúnem contratos firmados entre junho de 2020 e junho de 2025 e que permaneciam ativos até o mês passado, informação mais recente disponível. Os números contemplam três modalidades de consignado: empréstimo, cartão de crédito e cartão de benefícios.

Os consignados para pessoas com mais de 120 anos são descontados principalmente de benefícios de pensão ou aposentadoria rural. Apenas cinco contratos estão vinculados a espécies urbanas de pensão.

Um técnico com experiência na área de Previdência avaliou, sob reserva, que os dados indicam possíveis erros de cadastro ou, mais grave, irregularidades nos benefícios e nos consignados.

Segundo o INSS, existem outros 2,5 milhões de contratos ativos de beneficiários com idade entre 80 e 120 anos. Nessa faixa etária, a tomada de crédito não é proibida, mas tende a ser mais difícil ou custosa devido ao maior risco de inadimplência, uma vez que o pagamento da prestação depende da continuidade do benefício.

A legislação prevê que, em caso de morte do tomador de consignado do INSS, o saldo do empréstimo é automaticamente quitado. Para as instituições que concedem o crédito, esse é um fator adicional de risco na análise da operação.

Zanardi, do IBDP, citou que há um problema comum de familiares realizarem a contratação de consignados em nome de um parente beneficiário do INSS, principalmente quando eles vão ficando mais velhos. “Existem abusos nesse sentido”, afirmou.

CRÉDITO PARA IDOSOS ABAIXO DE 60 ANOS

Os dados do INSS obtidos via LAI também mostram 890 contratos ativos de crédito consignado para beneficiários do BPC (Benefício de Prestação Continuada) com menos de 60 anos, apesar de a lei fixar uma idade mínima de 65 anos para receber a assistência.

Os dados consideram apenas o BPC idoso, sem contabilizar operações vinculadas ao benefício para pessoas com deficiência, para o qual não há idade mínima.

Procurado, o INSS não esclareceu quantas pessoas com menos de 65 anos recebem o BPC idoso, nem quais seriam as circunstâncias da eventual concessão desses benefícios (se houve determinação judicial, por exemplo).

Para a coordenadora do IBDP, o dado também chama a atenção. “Pela legislação em vigor, BPC idoso somente é concedido acima de 65 anos”, afirmou.

Idiana Tomazelli/Folhapress



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IPI zero para ‘carros verdes’ cresce venda, mas governo não fatura



Foto: Reprodução/Instagram
No sábado (23), o vice-presidente e ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, participou de visitas a concessionárias em São Paulo 24 de agosto de 2025 | 18:31

IPI zero para ‘carros verdes’ cresce venda, mas governo não fatura

A isenção de IPI sobre veículos novos menos poluentes fez a média diária de vendas saltar de 437, em julho do ano passado, para 509, em julho deste ano.

Para a Anfavea, a associação das montadoras, e o ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, o crescimento de 17% nessa média se deve ao lançamento do programa Carro Sustentável, em vigor desde 11 de julho deste ano.

Para ter acesso aos benefícios, as montadoras terão de atender a alguns requisitos. Os veículos precisam emitir menos de 83 gramas de CO2 por quilômetro, ter etapas essenciais de produção no Brasil (o que exclui os elétricos chineses disponíveis hoje) e alcançar, pelo menos, um índice de 80% de reciclabilidade.

No sábado (23), Alckmin participou de visitas a concessionárias em São Paulo. Em uma de suas publicações nas redes sociais, o ministro afirmou que, em umas lojas da Volkswagen, as vendas quase dobraram.

Na comunicação do governo federal, no entanto, os resultados passam despercebidos, sem a publicidade esperada pelos fabricantes e até pelo ministério.

Julio Wiziack /Folhapress



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