Bahia Já – Cultura – SALVADOR 476 ANOS: COMO ERA A CIDADE HÁ 100 ANOS TEMPO DE JOAQUIM (TF)


Os políticos circulam todos no centro. O governador morava no Palácio Aclamação e despachava no Palacio Rio Branco reconstruído em 1919. O intendente despachava no prédio da Câmara.


Tasso Franco , Salvador |
22/03/2025 às 19:10

O intendente despachava no prédio da Câmara

Foto: REP

   Há 100 anos o intendente (correspondente ao cargo de prefeito) de Salvador era Joaquim Wanderley de Araújo Pinho, hoje, um ilustre desconhecido. Joaquim foi nomeado pelo governador Francisco Góis Calmon (1924-1928) e se tornou alcaide por dois anos sendo substituído por outro ilustre desconhecido, Eloy Paraíso Jorge (1926/27) e este pelo coronel Francisco Gomes Marzagão Ribeiro (1928).

   Joaquim era filho do ex-governador João Ferreira de Araújo Pinho (1908/a 22 de dezembro de 1911) quando renunciou pressionado por Seabra e o bombardeio à cidade autorizado pelo presidente marechal Hermes.

   O que tentarei mostrar neste texto é como era Salvador, em 1925, como vivia a população, os costumes daquela época, meios de transporte, educação, cultura e algo mais que souber do que já li sobre esse momento da cidade.

   A capital baiana tinha 300.000 habitantes (algo em torno de 7,8% do total do estado 4 milhões), não havia RMS, a pobreza era mais explicita do que nos dias atuais e seu território se estendia na linha Norte até Abrantes (Lauro de Freitas só vai existir em 1962 com emancipação do distrito de Santo Amaro do Ipitanga), e seu perímetro urbano real abrangia a cidade baixa até a Península de Itapagipe com densidade habitacional menor; e a cidade alta se estendia entre o centro histórico Além Carmo até o Rio Vermelho. 

   Tudo mais era arrabaldes e fazendas. E na beira do Atlântico colônias de pescadores que se estendiam entre Itapagipe e Abrantes; no miolo chácaras em Brotas, Cabula, Retiro, etc.

   A cidade era dividida em 12 distritos: Conceição, Pilar, Sé, Paço, São Pedro, Santana, Nazaré, Mares, Penha, Vitória, Brotas e Santo Antônio, este com maior expansão predial (6.355) e estabelecimentos em negócios (214). 

   O sistema de transporte público era feito por bondes elétricos e havia linhas entre a Baixa do Bonfim e o Comércio (bondes da família Ariani); a na cidade alta do centro a Barra e a linha que atendia o Rio Vermelho que seguia via Vasco da Gama chamada Rio Vermelho de Baixo (de Ramos de Queiroz). 

   Já havia muitos veículos automotores particulares e alguns caminhões trafegavam transportando mercadorias do cais para os armazéns. 

   Foi no governo Gois Calmon que houve a interligação rodoviária completa entre Salvador a Feira de Santana. A chegada a Salvador se dava pela Ladeira de São Caetano, Largo do Tanque, Baixa do Fiscal, Calçada e Comércio seguindo para a cidade alta via Ladeira da Montanha.

   O sistema de transporte complementar era feito por barcos, burros, cavalos, charretes e carroças. O abastecimento da cidade em gêneros alimentícios – farinha, açúcar, verduras, carnes, pescados, etc – era feito pelos saveiros que vinham do Recôncavo e também traziam telhas, tijolos, materiais de construção, etc – e os alimentos importados vinham de Lisboa (ou da Europa) – vinho, bacalhau, tecidos, remédios, etc – por navios.

   Os barcos nativos ancoravam na rampa do Mercado Modelo (o antigo, quase em frente ao Elevador Lacerda) e os navios no Cais Dourado da Velha Bahia, por onde também chegaram algumas doenças. Não havia supermercados. Os armazéns de gêneros alimentícios (chamados de secos e molhados) a maioria era de descendentes de portugueses (a invasão dos galegos espanhóis nesse campo e outros vai se dar com maior for a partir da guerra civil espanhola na década de 1930) e as feiras livres é que atendiam as famílias, a maior delas na Água de Meninos.

   Os ônibus só começaram a circular na década de 1930 com as marinetes italianas e haviam os bondes mistos cargueiros, como bondes para passeios e os funerários.

   

   A vida política, econômica, jurídica e cultural da cidade se concentrava ente o bairro da Conceição (Comércio) ao centro histórico especialmente entre os distritos da Sé e do São Pedro. A vida mundana mais florescente era na Rua São Bento de Baixo (atual Carlos Gomes) e na Ladeira de São Bento com extensão ao Largo do Teatro São João, que pegou fogo em 1923, onde ficam os hotéis mais chiques da cidade, o Paris e o Sulamericano, e hospedavam artistas, os ricos do cacau do fumo, as vedetes e os políticos.

   O governo Góis Calmon não deu atenção a ampliar o urbanismo iniciado com mais vigor por JJ Seabra e Moniz Aragão com a abertura da Avenida Sete até a Barra e a modernização do Comércio e na mensagem que enviou a Assembleia em abril de 1925 falou mais dos trabalhos que realizou no interior (900 km de estradas, etc, etc e sobre o fortalecimento da economia baiana que era sustentada no tripé cacau-fumo-café. 

   A essa altura o açúcar tinha decaído, mas, como Góis Calmon era ligado a esse segmento investiu bastante para tentar soergue-lo.

   Vale observar que Salvador nesta época ainda tinha algumas fábricas de tecidos e a Bahia produziu 50.005.336 metros de fazendas – segundo o governador – e na capital existiam pequenas indústrias de velas, torrefação de café, chapéus, perfumes, móveis, tintas, calçados e bebidas entre outras. Algumas dessas fábricas funcionavam no distrito da Boa Viagem.

   Os políticos circulam todos no centro. O governador morava no Palácio Aclamação e despachava no Palacio Rio Branco reconstruído em 1919. O intendente despachava no prédio da Câmara. O Senado estadual funcionava na rua 28 de Setembro, no primeiro andar onde existia a Escola de Belas Artes e se mudou para o Terreiro de Jesus; e a Câmara dos Deputados no Palacete Machado, Campo Grande; e o Poder Judiciário era espalhado em imóveis na Rua Chile, Piedade e Terreiro. O Tribunal de Justiça só nasce em 1946 e o Fórum Ruy Barbosa na década de 1950, governo Mangabeira.

   Era essa salada de frutas e os políticos da capital e do interior circulavam nesse quadrilátero entre o Campo Grande e o Terreiro.

   O Teatro Politeama e os Clubes Euterpe e Fantoches os mais glamurosos. Os homens usavam ternos de linho branco e chapéus (ou ternos escuros e gravata borboleta) e as mulheres saias compridas e chapéus estilo melindrosa (tipo uma touca).

   No Carnaval quando a sociedade ia para as ruas com mais intensidade, havia os desfiles das pranchas dos clubes carnavalescos, dos corsos com carros Ford de Bigode e a população negra já tinha seus blocos afros e batucadas. A dança de salão mais popular era o foxtrote (uma mistura de jazz e valsa quaternária) e estava em moda as grandes bandas ou orquestras.

   O cabaret mais famoso dessa época, salvo engano, era o da Célia e na Pensão na Nova de São Bento que promovia leilões de cabaços. O historiador Luis Henrique Dias Tavares num livro de contos narra uma dessas histórias.

   Os meios de comunicação de massa, na época predominava os jornais, mas começou a era de ouro do rádio e a Sociedade da Bahia completava seu primeiro ano de vida, uma novidade e tanto. Os jornais eram bem politizados especialmente A Tarde e o Imparcial este último adversário feroz de Gois Calmon e defensor do coronelato, à frente, Wilson Lins, que era filho do coronel do São Francisco, Franklin Albuquerque.

   Claro que tem muito mais coisa e não dá pra contar tudo aqui. Pincelei apenas alguns pontos.

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