É preciso barrar as desafetações ilegais de terrenos públicos e áreas verdes em Salvador – Artigo


Em 2017 a Prefeitura de Salvador, sob a gestão de ACM Neto, enviou para a Câmara de Vereadores o PLE-223/2017 para desafetação de 31 imóveis, dentre os quais estavam áreas verdes. O Projeto de Lei foi aprovado e sancionado:  Lei Municipal 9233/2017.

 

Logo após, em 2018, uma ação popular foi impetrada para reconhecer a ilegalidade desse processo. Isso porque não se deve admitir a desafetação e venda desses terrenos para uso diverso daquele previsto na Lei de Loteamentos, que é a manutenção deles como um espaço não-edificado.

 

Na última quarta-feira (12) estava marcado o julgamento a ser realizado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça da Bahia, bastante aguardado por diversas entidades, conselhos (como o CAU e o CREA) e demais setores da sociedade civil que lutam por políticas públicas do Direito à Cidade.  No entanto, a sessão que julgaria a ação começou, mas foi suspensa no final da manhã por falta de quórum. A expectativa que tínhamos, para o bem da cidade e dos munícipes, era da decisão salutar de inconstitucionalidade da Lei Municipal.

 

A ação popular nº 0509103-29.2018.8.05.0001 foi ingressada por entender a Lei Municipal 9233/2017 como inconstitucional por vários motivos: apresenta indícios de ilegalidade, pois as áreas verdes vendidas possuem uma função em si que é garantir a permeabilidade do solo, o conforto térmico e ambiental e controlar a densidade urbana.  Esperamos e confiamos em nossa Justiça, para que essa inconstitucionalidade flagrante seja declarada.

 

Enquanto isso, continuaremos na luta para garantir o reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Municipal 9233/2017. Caso seja este o entendimento do TJ-BA, surgirá importantíssimo precedente para que as diretrizes de desafetação e venda de áreas verdes de Salvador sejam constitucionalmente adequadas.

 

O valor das áreas verdes não se mede pelo quanto de IPTU é capaz de gerar, mas pelo benefício que a sua existência traz para a sociedade. As áreas verdes são uma garantia do conforto térmico e ambiental da capital baiana e a lei permitiu a alienação desses espaços com grande potencial ecossistêmico, sem justificativa plausível, prestação de esclarecimentos à população, tampouco participação popular.  

 

Afinal, qual o motivo de decretar a perda da finalidade pública das áreas? A quem elas irão servir? Qual o destino dado? Quais estudos técnicos adequados foram realizados para justificar a desafetação das áreas verdes? Esses questionamentos nunca foram respondidos, mesmo depois de inúmeras solicitações à prefeitura, pondo em xeque a legalidade das desafetações do ex-prefeito.

 

É importante ressaltar que, quando uma pessoa ou empresa possui uma grande área e tem a intenção de empreender nela, dividindo-as em lotes para que nessas áreas sejam edificadas construções (casas ou prédios, a depender do tamanho desses lotes), a Lei Federal 6766/79 prevê que parte da área precisa ser doada ao Município para que nelas sejam desempenhados serviços públicos, como áreas escolares e institucionais, além de resguardar áreas verdes. Não vemos nada disso acontecer. Mesmo depois de inúmeras solicitações à prefeitura, esses questionamentos nunca foram respondidos, pondo em xeque a legalidade das desafetações do ex-prefeito.

 

Isso tudo às custas do conforto térmico, ambiental e urbano da cidade, tendo em vista que essas áreas ampliarão a densidade populacional na região, maiores engarrafamentos e sobrecarga de serviços básicos como consumo de água, energia, cabeamentos aéreos e subterrâneos e esgoto.

 

A cidade e a população não suportam mais esse modus operandi, que é o desvirtuamento da retirada dessas áreas do proprietário original com destino à Prefeitura sob o pretexto de conservação. Feito isso, a gestão municipal não zela pelas áreas e, de maneira inconstitucional, revende-as, para qualquer pessoa, por qualquer valor, burlando a finalidade da Lei de Loteamentos e gerando especulação imobiliária pelo próprio ente público.

 

Lembro aqui que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem precedentes que definem a desafetação e vendas dessas áreas como desvio de finalidade por parte da Prefeitura, uma conduta incompatível com a obrigação de preservação e de garantir um ambiente urbano equilibrado para a população.

 

A população de Salvador merece, e clama por uma cidade pensada e planejada para a preservação de suas áreas verdes e de seus espaços públicos, e que tenha como principal objetivo a melhoria da qualidade de vida de toda a sua gente.

 

*Marta Rodrigues é vereadora de Salvador pelo PT e integrante da Comissão de Finanças, Orçamento e Fiscalização

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias

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