Derrubada de decreto do IOF reduziria despesas livres do governo a nível crítico de R$ 72 bilhões



Foto: Diogo Zacarias/Ministério da Fazenda/Arquivo
Os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) 02 de junho de 2025 | 18:15

Derrubada de decreto do IOF reduziria despesas livres do governo a nível crítico de R$ 72 bilhões

A eventual derrubada do decreto do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) pode reduzir a R$ 72,4 bilhões o espaço que o governo tem para realizar investimentos e honrar despesas ligadas ao funcionamento dos órgãos.

O patamar é considerado crítico por técnicos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que veem risco de paralisação de atividades dos órgãos ou corte excessivo de investimentos.

O ministro Fernando Haddad (Fazenda) manifestou preocupação com o tema na noite de quarta-feira (28), após reunião com lideranças do Congresso. “Nós ficaremos num patamar bastante delicado do ponto de vista do funcionamento da máquina pública do Estado brasileiro”, disse.

O Orçamento de 2025 reserva R$ 222 bilhões em despesas discricionárias, que incluem gastos com custeio (como pagamento de contratos e contas de luz e água) e investimentos (como realização de obras ou aquisição de equipamentos). Desse valor, R$ 50,4 bilhões são carimbados para emendas parlamentares, e outros R$ 60 bilhões ajudam a cumprir os mínimos de saúde e educação.

Na prática, o governo tem R$ 111,6 bilhões para despesas livres. É sobre essas rubricas que recai boa parte do congelamento de R$ 31,3 bilhões anunciado em 22 de maio.

Segundo cálculos do governo, a contenção sobre as despesas livres será de R$ 24,2 bilhões, somando bloqueio e contingenciamento, e o restante atingirá as emendas.

O bloqueio é mais difícil de ser desfeito, uma vez que as despesas são canceladas para abrir espaço ao crescimento de gastos obrigatórios (como benefícios previdenciários). Já o contingenciamento serve para assegurar a meta de resultado primário após a constatação de frustração de receitas e pode ser revertido se a arrecadação melhorar.

A equipe de Haddad lançou mão do IOF justamente para sustentar as receitas em um patamar mais elevado e evitar um aperto ainda maior nas contas. Mesmo com a medida, o espaço livre para despesas do governo já caiu a R$ 87,4 bilhões.

Eventual derrubada do decreto sem que haja outra fonte de compensação forçará o governo a congelar outros R$ 19,1 bilhões, distribuídos entre emendas e gastos discricionários. O montante já desconta da estimativa de arrecadação inicial (R$ 20,5 bilhões) a perda de R$ 1,4 bilhão com o recuo na taxação das remessas ao exterior feitas por fundos brasileiros de investimento —já compensada pelo saque de recursos da União em fundos privados.

Simulações internas indicam que, em caso de novo congelamento, as despesas livres seriam reduzidas em até R$ 15 bilhões. O valor final dependeria de como a trava seria distribuída, já que os pisos de saúde e educação também encolheriam em decorrência da arrecadação menor com impostos.

O arcabouço fiscal assegura um patamar mínimo de execução das despesas discricionárias, equivalente a 75% do valor autorizado na Lei Orçamentária Anual. Isso significa que o contingenciamento poderia ir a 25% do montante previsto. Nas condições atuais, ele está em cerca de 10%.

Embora a lei permita formalmente o contingenciamento adicional, técnicos do governo avaliam que a aplicação do dispositivo, sugerido pelo Legislativo, é inviável na prática. O resultado, na avaliação desses interlocutores, seria a paralisação de políticas, de órgãos do governo ou de redução drástica de investimentos —tudo isso a pouco mais de um ano das eleições de 2026.

Apesar dos apelos do governo, o Congresso exerce forte pressão contra o aumento do IOF. Na quinta, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), criticou o que chamou de “gambiarras tributárias” e alertou que o clima no Parlamento é pela derrubada do decreto.

Motta se reuniu na noite de quarta-feira (28) com Haddad e a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais). O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e lideranças do Congresso também participaram.

Segundo o presidente da Câmara, ficou combinado com a equipe econômica que ela teria dez dias para apresentar uma alternativa à arrecadação com o imposto.

Na manhã de quarta, Haddad disse que explicou ao comando das duas Casas que a derrubada do decreto deixaria a máquina pública em situação delicada.

No dia seguinte, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que a eventual derrubada do decreto de aumento do IOF seria equivalente a extinguir o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida e os investimentos do Ministério da Defesa.

Nesta segunda (2), Haddad afirmou que acertou com Motta e Alcolumbre a tomada de medidas que possibilitem uma calibragem no decreto de elevação do IOF e a retomada de reformas estruturantes.

Para dar uma dimensão do efeito disso sobre as políticas, o secretário destacou que o programa habitacional tem R$ 12 bilhões reservados para este ano, enquanto a Defesa, incluindo as Forças Armadas, contam com R$ 8 bilhões para investimentos.

“[Derrubar o decreto] significaria o equivalente a extinguir todo o Minha Casa, Minha Vida e todo o investimento do Ministério da Defesa”, disse Ceron.

A comparação não representa uma relação direta entre eventual derrubada do decreto e a suspensão dessas políticas, pois o congelamento de verbas poderia ser distribuído entre mais pastas do Executivo. Segundo o secretário, o objetivo foi “dar a dimensão da importância da discussão”.

O governo quer manter o aumento do IOF pelo menos em 2025 e negociar alternativas à medida apenas para 2026.

Ministros do governo Lula informaram à cúpula do Congresso que não há condições de abrir mão da arrecadação vinda da alta do tributo e que não há tempo para elaborar outras medidas neste ano.

Essa avaliação foi explicitada pelo próprio secretário. “A margem para absorver isso é muito difícil. Então, ela [receita] é imprescindível, a não ser que se tenha uma outra solução que gere o mesmo resultado”, afirmou. “Neste momento, não há alternativa ao IOF e ele é imprescindível”.

Idiana Tomazelli/Folhapress



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